sábado, 27 de junho de 2015

A simplicidade da complexidade das coisas.



Quando eu era pequena as coisas eram bem diferentes do que são agora.
Me lembro que o mundo era bem mais simples.

Meu sonho era ser cientista e conquistar o mundo. E começava minha árdua tarefa de ser uma revolucionária cientifica observando formigas e decorando os tipos de nuvens. Com o tempo, fui desenvolvendo um tipo peculiar de curiosidade.
Era uma curiosidade por tudo. Tudo era fantástico, e era muito importante se saber de onde as coisas vinham e pra que serviam, e mais ainda, gastava minhas tardes à procura do que fazer com as coisas que eu julgava ter menos importância do que deveriam.

Nunca vou me esquecer do dia em que desenvolvi mentalmente um projeto (que nunca saiu do plano das ideais) de um carro  movido a bananas. Porque eu achava a fruta muito maravilhosa para servir única e exclusivamente para se comer.

Logicamente meus desejos de futuros promissores incluíram o desejo de ser cientista da NASA, ser jornalista, telefonista (porque fui com minha mãe a uma agencia de cobranças em que as moças usavam aquele aparelho maravilhoso chamado head-set e usavam uniforme cinza e eu achei aquilo simplesmente fantástico e futurista, mal sabia eu que anos depois ia parar num call-center e me arrepender profundamente do sonho), veterinária…enfim….forma muitos os planos pro futuro.

O que aconteceu no meio do caminho? O mundo mudou.

De repente eu não sentia mais aquele maravilhoso cheiro de leite que ferveu e derramou no fogão limpinho porque alguém se descuidou dele. E as torradas? Era aquele cheirinho de café passado na hora com leite derramado e torradas. Porque apareceu uma coisa fantástica lá em casa chamada micro-ondas e esquentar leite virou coisa de minutos.

E domingo então? Ver a formula um com o Aírton Senna era programa obrigatório, a família se reunia no sofá para isso. Bom, o Senna morreu, mas daí a gente preenchia as tardes assistindo filme alugado na locadora. E era sempre a mesma historia: a fita teria de ser rebobinada antes de ser entregue, mas o ultimo cidadão entregou a fita na locadora sem rebobinar, então a gente via todo o filme de trás pra frente, pra depois ver ele normalmente.

Jogar taco na rua era atividade obrigatória, eu particularmente não era muito de brincar na rua porque minha mãe não deixava, mas a gurizada ficava até nove, as vezes dez horas da noite, na rua, jogando bola, correndo, brincando, pulando, sendo criança, sendo feliz, porque o sol demorava mesmo muito pra se por e o dia escurecer de fato.

E ainda tinha gente ainda mais feliz que eu neste sentido. Gente que subia em árvores, gente que fazia carrinho de rolimã, gente que apanhava frutas do pé pra comer, gente que brincava de pega-pega e esconde-esconde horas e horas a fio sem se cansar.

Acho que não existe a necessidade que eu me estenda muito para se entender que hoje é bem diferente. E sendo bem egoísta, bem mesmo, nem me importo tanto com esta geração de hoje, que perde suas manhas e tardes jogando ou assistindo TV ou fazendo qualquer outra coisa ao invés de viver. Isso é problema deles, não meu. Quando forem velhos caquéticos saberão que fizeram as escolhas erradas.  

Eu me preocupo é de ter perdido a simplicidade da complexidade das coisas.

Sim, lógico que aquecer o leite no micro-ondas é infinitamente melhor , mais rápido e mais prático do que perder tempo em ficar de olho numa leiteira cheia de leite. Mas e a magia do leite derramado? A magia do aroma do café da tarde?
- “Mas então porque você não aquece seu leite numa leiteira já que está reclamando tanto”, você pode pensar…e eu te respondo com outra pergunta – o que fizeram com meu tempo, que eu tinha antes em ficar de olho numa leiteira ( e ainda assim deixar o tal do leite derramar porque aptidão pra ser boca berta eu sempre tive mesmo) e agora mal tenho tempo de fazer um xixi em paz?”

-“Porque não assiste fita K7 então, sua saudosista, você pode pensar”… - porque não se fabricam mais aparelhos de vídeo como aqueles trambolhos enormes que tínhamos e logo foram substituídos por dvds e ainda pouco por um outro dispositivo chamado Blue-ray que eu ate agora não entendi patavinas de qual a diferença….Porque ninguém quer mais perder tempo assistindo filmes de trás pra frente, porque todos querem qualidade de som e imagem, porque todos querem algo que nem sequer existia para que quiséssemos naqueles tempos, mas que agora existe e veio pra ficar.

Se você for analisar com calma e cuidado vai ver que era simples sim. Complexas no procedimento, mas simples na apreciação.

Daí veio o tal do futuro, com suas maravilhas, prometendo simplicidade, conforto, nos vendendo sonhos que nem sabíamos que tínhamos (porque na verdade não os tínhamos), e numa artimanha maligna nos roubaram nosso tempo. Nos roubaram nossa forma de ver o mundo, porque o que sempre foi hoje já não é mais, e amanha também já não será o que é hoje, porque tudo fica mudando e mudando e mudando de novo numa velocidade tão rápida que já não vale a pena se ter tantos sonhos a longo prazo, como eu costumava ter, porque amanha já não vai ser mais assim.

E o que me resta desta constante falta de tempo, desta loucurada toda?


Voltar ao meus planos de carros movido a bananas….




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